Naquela noite cheguei a casa com a sensação de ter acabado de cometer um crime, mas não com a mesma sensação de quem mata por gosto. Tinha acabado de cometer o maior crime de todos! Beijei o Gabriel, alguém que eu não conhecia, mas, mais importante do que ser o Gabriel ou ser alguém que eu desconhecia por completo, tinha beijado essa pessoa e esse, era, sem sombra de dúvida, a mais dolorosa traição para o Filipe. Abri a porta de casa onde pairava o mais puro dos silêncios. Estava finalmente protegida ali, entre aquelas paredes que sempre me conheceram. Ninguém me poderia apontar o dedo pelo que tinha acabado de fazer. Estava completamente envolvida entre elas e isso dava-me a mais bela sensação de alívio, de quem está a salvo. Subi as escadas e entrei no meu quarto. Deitei-me na minha cama, com a cabeça na minha almofada, sem mudar de roupa primeiro, sem antes despir as provas do crime. A vida, às vezes, prega-nos mesmo partidas, as quais não estamos à espera. A vida tinha acabado de me pregar uma. Revivi aquele pedaço de noite com o Gabriel, passo a passo, hora a hora, minuto a minuto, tentando perceber o porquê de cada palavra e o modo como cada uma delas tinha sido dita. Parei no beijo, congelei o pensamento nessa altura e revivi esse momento segundo a segundo. Não queria ter o privilégio de esquecer nada do que tinha acontecido e do que tinha vivido. Quase que senti, pela segunda vez na mesma noite, o que o beijo do Gabriel me tinha feito sentir depois de termos saído do Chapitô. A mesma intensidade, o mesmo calor, os mesmos pensamentos, a mesma sensação de pertença a um alguém que não era o Filipe, e que ultrapassava a sensação de pertença ao Filipe. Percebi que algo se tinha passado enquanto nos beijávamos mas não quis encontrar resposta para a minha pergunta: “Porquê?”. Sempre acreditei na existência de coisas, de dúvidas nossas que, em certo período da nossa vida, não conseguimos explicar mas que, mais tarde, depois de esperarmos um tempo de minutos indefinidos, acabamos por obter resposta, e a minha única vontade enquanto estive deitada na minha cama foi não querer, nem conseguir explicar, o porquê de me ter sentido como senti.
terça-feira, setembro 11, 2007
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